Inácio elevou um dos anciãos acima dos demais. O ancião promovido era agora chamado de “o Bispo”. Todas as responsabilidades que pertenceram ao colegiado de anciões eram exercidas pelo Bispo.
Em 107 d.C., Inácio escreveu uma série de cartas enquanto seguia para Roma antes de ser martirizado. Seis de suas sete cartas tratavam do mesmo tema. Estavam carregadas de uma exaltação exagerada à autoridade e à importância da posição do Bispo.
Segundo Inácio, o Bispo teria a última palavra e deveria ser prontamente obedecido. Considere os seguintes extratos de suas cartas: “Todos vocês sigam o Bispo como Jesus Cristo segue o Pai… Ninguém fará qualquer negócio da igreja sem o Bispo… Onde o Bispo estiver ali deve estar o povo… Vocês nunca devem atuar independentemente do Bispo e do clero. Olhem seu Bispo como um tipo de Pai… Tudo o que ele aprova, agrada a Deus…”.
Para Inácio, o Bispo tomara o lugar de Deus enquanto que os presbíteros tomaram o lugar dos doze Apóstolos. Apenas o Bispo poderia celebrar a Santa Ceia do Senhor, dirigir os batismos, dar conselhos, disciplinar os membros da igreja, aprovar os matrimônios e pregar sermões.
Os anciãos se sentavam ao lado do Bispo durante a Ceia do Senhor. Mas era o Bispo quem a ministrava. Ele, se encarregou do culto público e do ministério. Somente em casos excepcionais poderia um “leigo” ministrar a Ceia do Senhor sem a presença do Bispo. O Bispo, dizia Inácio, necessita “presidir” sobre os elementos e distribuí-los.
Na mente de Inácio, o Bispo era o remédio que curava a falsa doutrina e estabelecia a unidade na igreja.
Inácio acreditava que a sobrevivência da igreja ao assalto da heresia dependia do desenvolvimento de uma estrutura poderosa e rígida como a estrutura política centralizada em Roma.A regra do governo por um Bispo único resgataria a igreja da heresia e da divisão interna.
Historicamente, isso é conhecido como o “mono-episcopado” ou “episcopado monárquico”. É o tipo de organização onde o Bispo é distinto dos anciãos (o presbítero) e é superior a eles.
Jesse Lyman Hurlbut, em História da Igreja Cristã, destaca que desde o reinado de Trajano ao de Antonino Pio (98-161), o Cristianismo não era reconhecido, mas também não foi perseguido de modo severo. Sob o governo dos quatro imperadores Nerva, Trajano, Adriano e Antonino Pio (os quais, com Marco Aurélio, foram conhecidos como os “cinco bons imperadores”), nenhum cristão podia ser preso sem culpa definida e comprovada. O espírito da época inclinava-se a ignorar a religião cristã. Contudo, quando se formulavam acusações e os cristãos se recusavam a retratar-se, os governantes eram obrigados, contra a própria vontade, a pôr em vigor a lei e ordenar a execução. Alguns mártires proeminentes da fé executados nesse período foram os seguintes: Simeão (ou Simão; Marcos 6:3), o sucessor de Tiago, bispo da igreja em Jerusalém e, como aquele, era também irmão do Senhor. Diz-se que alcançou a idade de cento e vinte anos. Foi crucificado por ordem do governador romano na Palestina, no ano 107, durante o reinado de Trajano.
Inácio, bispo de Antioquia da Síria. Ele estava disposto a ser martirizado, pois durante a viagem para Roma escreveu cartas às igrejas manifestando o desejo de não perder a honra de morrer por seu Senhor. Foi lançado às feras no anfiteatro romano, no ano 108 ou 110. Apesar de a perseguição durante estes reinados não haver sido tão forte como a que se manifestou depois, contudo, registraram-se vários casos de martírios, além dos dois que já registramos.
Knight e Anglin, em História do Cristianismo, destacam que Inácio, que dizem ter conhecido os apóstolos Pedro e João, e ter sido ordenado bispo de Antioquia pelo apóstolo João, foi martirizado durante essa época. O zelo com que ambicionava sofrer o martírio o expôs a censuras de vários historiadores, e com certa razão.
Conta-se que na ocasião em que Trajano visitou Antioquia, ele pediu para ser admitido a presença do imperador, e depois de explicar, por bastante tempo, as principais doutrinas da religião cristã, e mostrar o caráter inofensivo daqueles que a professavam, pediu que se fizesse justiça. Contudo o imperador recebeu o seu pedido com desprezo, e depois de censurar aquilo que Trajano se aprazia de chamar a sua superstição incurável, ordenou que fosse levado para Roma e lançado às feras.
Aramis C. DeBarros, em Doze Homens, Uma Missão, lembra que Pedro esteve entre as autoridades que cuidaram do treinamento e do desenvolvimento da Igreja de Antioquia em seus primórdios. Sobre esse tema, a figura de Inácio, bispo de Antioquia, assume grande importância, já que esse famoso autor e mártir patrístico foi contemporâneo dos apóstolos. Ademais, Eusébio confirma que a Igreja de Antioquia foi fundada por São Pedro, o qual se tornou seu primeiro bispo, antes de sua transferência para a sé romana. De acordo com a tradição, ele presidiu ali por sete anos, de 33 a 40 A.D., quando nomeou São Evódio como seu vigário antes de partir em direção oeste. Enquanto o círculo da pregação do Evan-gelho se expandia no sentido leste para Edessa, Nisibis e para a distante Malabar, com os apóstolos Tomé e Mar Addai (São Tadeu), a queda de Jerusalém em 70 A.D., apenas contribuiu para o aumentado número de cristãos que se dirigiam para Antioquia.
Escrevendo acerca do ministério de Inácio em Antioquia, o historiador Eusébio de Cesaréia acabou acrescentando algo interessante sobre a passagem de Pedro na cidade síria (op. cit., p.120). “Por este tempo floresceu Policarpo na Ásia, um íntimo discípulo dos apóstolos, que recebeu das mãos de testemunhas e servos do Senhor o epis-copado da Igreja que está em Esmirna. Na mesma época, Papias foi reconhecido como bispo da Igreja de Hierápolis; homem deveras capaci-tado em todo conhecimento e muito familiarizado com as Escrituras. Da mesma sorte, Inácio, que é celebrado por muitos até o presente dia como sucessor de Pedro em Antioquia, tornou-se o segundo a exercer o ofício episcopal naquele lugar.“
Philip Schaff, em Hist of Christ’n Church, avalia que o quadro de Antioquia foi prejudicado pelos interesses das heresias e ortodoxias. Ele identifica que a tradição dividiu a igreja de Antioquia em 2 Paróquias com 2 bispos, Evodius e Inácio, um instituído por Pedro, o outro por Paulo. Eusébio, em História Eclesiástica, relata: ” Mas dos de Antioquia, depois de Evodio, primeiro que foi instituído, no tempo de que falamos era muito conhecido o segundo: Inácio. Igualmente nestes mesmos anos, o ministério da igreja de Jerusalém era exercido por Simeão, segundo depois do irmão de nosso Salvador.”
Oskar
Skarsaune, no
livro À sombra do Templo, reconhece que o terceiro dos mais antigos pais
apostólicos, Inácio, é o mais enigmático de todos. Ele foi bispo de Antioquia,
na Síria, foi preso e enviado a Roma; no caminho, visitou algumas comunidades
cristãs na província da Ásia, tendo dialogado com emissários de outros
cristãos. Suas sete cartas, escritas durante a viagem rumo ao martírio em Roma
por volta de 110 d.C., são peculiares do ponto de vista lingüístico, originais
do ponto de vista teológico, e sua interpretação é alvo de acaloradas disputas
entre os estudiosos.
A
importância de Inácio para o nosso contexto deve-se ao fato de que se 1Clemente
e a Didaquê mostram-se profundamente judaicos, Inácio não. Em
Inácio, o contexto judaico do cristianismo parece muito mais distante do que em
qualquer outro escrito cristão anterior ao dele (ou imediatamente posterior a
ele, como veremos). Isto se deve, em parte, ao caráter de suas cartas:
- É monstruoso falar de Jesus Cristo e praticar o judaísmo. Porque o cristianismo não baseou sua fé no judaísmo, e sim o judaísmo no cristianismo, e toda língua que crê em Deus foi reunida por ele (Aos magnésios 10.3)
- Se, porém, alguém interpretar o judaísmo para vós, não o ouçais; porque é melhor ouvir o cristianismo dos circuncidados do que o judaísmo dos incircuncisos (Aos filadelfienses 5.2-6.1)
Temos a impressão de que o
relacionamento de Inácio com o AT era principalmente de cunho literário. Para
ele, o AT era um livro, e não um passado vivo que, por meio de tradições e
observâncias, determinara sua própria vida e seu pensamento. É isso, mais do
que qualquer outra coisa, que induz o gentio cristão ao erro. A posição de
Inácio pode ser mais bem caracterizada como uma ortodoxia neotestamentária.
Foram os escritos apostólicos que o levaram a valorizar o AT e a amar os
profetas. A autoridade do AT é indisputável, porém é derivada da autoridade do
Evangelho.
Duas
passagens dos pais apostólicos lidam explicitamente com o culto dominical; a
primeira delas encontra-se na Didaquê, a segunda, em Inácio:
- Se aqueles, então, que andavam segundo os costumes antigos, achegaram-se a uma nova esperança, não mais vivendo para o sábado, e sim para o Dia do Senhor, em que também nossa vida floresceu por meio dele e de sua morte [… ] e por esse mistério recebemos a fé (Inácio, Aos magnésios 9.]).
Essa
passagem de lnácio revela a razão da escolha desse dia: a ressurreição de
Cristo. E se a celebração da ressurreição de Cristo foi a causa principal da
reunião dominical, não era de esperar que ela se realizasse no domingo pela
manhã?
Adolf
Harnack, em The
Mission and Expansion of Christianity in the First Three Centuries,
denuncia que as sete epístolas de Inácio foram um comentário das idéias do
bispo redigidas por um escritor pagão.
- Ao chegar em Esmirna, ele foi saudado por representantes das igrejas de Efeso, Magnesia, e Tralles. Após alguns dias ali, ele lhes entregou cartas para suas respectivas igrejas.
- “Ore pela igreja na Síria,” ele escreve aos efésios. O termo “igreja católica” ocorre na carta a Esmirna (Smyrn., viii. 2).
- Ao deixar Esmirna», continua dizendo Eusébio, Inácio chegou a Trôade, e lá enviou novas cartas: duas às Igrejas de Filadélfia e de Esmirna.
- Inácio defendia reuniões freqüentes da igreja com o propósito de dirigir os membros para os serviços comunitários e evitar tentações e apostasias
- Para ele, só existia uma igreja quando equipada com bispos, presbíeros e diáconos para adoração comum e sacramentos.
- Nas cartas de Inácio, a igreja de Antioquia é chamada: “a igreja na Síria,” Rom. ix., Magn. xiv., Trall. xiii.) Ele se descreve como, “o bispo da Síria”, Rom. ii.).
- Ele entendia que os apóstolos de restringiram aos doze e Paulo (Rom. iv. 3), porém sua igreja o reconhecia como “mestre profético e apostólico” (Ep. Smyrn., xvi. 2).
Paul
Johnson, em A
History Of Christianity, identifica que Antioquia foi palco de muitos
cultos esotéricos. O Gnosticismo foi poderoso e pode ter influenciado o
Cristianismo após a saída dos apóstolos.
- Alguns cristãos parecem ter usado o Evangelho de Pedro. A ‘sucessão apostólica’ parece ter sido perdida completamente.
- Quando Julius Africanus, principal fonte de Eusébio, listou o número de bispos, em Antioquia encontrou 6 nomes no mesmo período de tempo, 12 em Roma e 10 em Alexandria.
William
Jones, em THE
HISTORY OF THE CHRISTIAN CHURCH VOL. 1, relata que quando Plínio escreveu
sua célebre carta, Trajano, chegou em Antioquia na Síria. Inácio era um dos
pastores daquela igreja; um homem de piedade exemplar.
- Durante a estada do imperador em Antioquia, a cidade foi quase totalmente destruída por um terremoto. Foi precedido por uma tempestade. Trajano ficou bastante ferido, escapando através da janela.